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A religião dos fracos

Em teoria não acreditamos que super-heróis existam. Em tese super-homem é uma realidade dos quadrinhos, televisão e cinema. Digo em teoria porque na verdade acreditamos que eles existam. No cotidiano cristão super-homens estão no consciente da maioria das pessoas. Sejam pastores, presbíteros, diáconos ou algum tipo de líder. As pessoas os veem como intocáveis e como inalcançáveis pelas mazelas da vida.


Dias atrás um líder religioso foi atacado durante um culto e acabou revelando para todo mundo que pastores também, literalmente, sangram. No entanto, a verdade é que a maioria das pessoas não quer um líder que sangra, que adoece, que perde o sono, que lida com ansiedade. Não, a maioria das pessoas quer um super-líder. Daqueles que nunca demonstram em seu rosto e corpo nenhuma marca de sofrimento. Quem sabe por isso a liderança cristã seja algo tão solitária e pesada. Afinal, existem poucos a quem você possa compartilhar suas fraquezas.


Outro perigo da liderança é que muitos líderes se tornam vítimas de seu sucesso. Por serem bons líderes e terem êxito em seu ministério acabam por se deixar sobrecarregar. Quanto mais bem sucedido um líder for mais carga sobre ele irão colocar. Na verdade, a maioria das pessoas estão preocupadas mais com a performance e êxito do que com as limitações e fraquezas de seus líderes. Líderes adoecem porque se esquecem de sua humanidade e pensam que a mesma não é compatível com o ministério.


Lembro-me de certa vez em que adoeci e uma irmã logo se apressou em perguntar se eu estava orando o bastante porque pastor doente é pastor que não ora. Outro episódio foi quando uma pessoa ficou indignada comigo quando lhe disse que sairia de férias. Sem mencionar as inúmeras comparações com “super pastores” da televisão vistos como verdadeiros homens de Deus. Certas situações me levaram a potencializar o automático do ‘está tudo bem’, quando perguntam se estou bem. E se pararmos para pensar essa é uma pergunta feita, na maioria das vezes, por mera formalidade. Poucas pessoas estão dispostas a ouvir que algo não está bem.


Apesar de tudo isso, descubro que o cristianismo não é a religião dos supers, mas sim, dos fracos. Começa com Deus se encarnando e se fazendo fraco para sofrer todas as mazelas da natureza humana. Em Cristo Deus chora (Jo 11:35), se cansa (Jo 4:6), dorme (Mt 8:24), enfim, em Cristo a divindade assume pra si a humanidade. O cristianismo é a religião da humanidade e não de sua negação. O fato de ser líder não tira de nós nossa humanidade. Inclusive os que exercem liderança precisam aprender que sua identidade está baseada no que se é e não no que se faz. Jesus ensina isso ao lavar os pés de seus discípulos.


O evangelho de João, capítulo 13, nos informa que: Um pouco antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que havia chegado o tempo em que deixaria este mundo e iria para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim. Estava sendo servido o jantar, e o diabo já havia induzido Judas Iscariotes, filho de Simão, a trair Jesus. Jesus sabia que o Pai havia colocado todas as coisas debaixo do seu poder, e que viera de Deus e estava voltando para Deus; assim, levantou-se da mesa, tirou sua capa e colocou uma toalha em volta da cintura. Depois disso, derramou água numa bacia e começou a lavar os pés dos seus discípulos, enxugando-os com a toalha que estava em sua cintura.


Destaco, da citação acima, o versículo 3. João nos informa que Jesus SABIA que tudo estava debaixo do seu poder, de onde viera e pra onde ia e por isso submete-se ao trabalho mais baixo que nem um escravo judeu fazia. Jesus não esconde suas limitações e nem se importa em não ser visto como o super messias. Líderes precisam parar de se preocupar em serem definidos pelo que fazem e passarem a viver pelo que são. Quando descobrirem o que de fato são começarão a respeitar seus limites e sua humanidade.


Líderes estão fadados ao fracasso quando não respeitam seus limites e sua humanidade. O apóstolo Paulo sabendo disso orienta Timóteo: Cuide de você mesmo e tenha cuidado com o que ensina. Continue fazendo isso, pois assim você salvará tanto você mesmo como os que o escutam (1 Tm 4:16). Líderes se perdem ou porque não cuidam de si mesmos, da doutrina ou de ambos. Então, ouçamos a palavra de Deus e não negligenciemos nossos limites e nossa humanidade.


Por Ismael Braz.



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